Instituto Crescer Legal completa, no dia 23 de abril, nove anos de contribuição com a aprendizagem profissional. Em entrevista, Denise Brambilla fala sobre os avanços obtidos nas contratações de jovens aprendizes e os desafios ainda existentes.
Denise Natalina Brambilla Gonzalez é hoje o nome referência quando o tema é aprendizagem profissional. Em seus mais de 40 anos de serviço como auditora fiscal do Ministério do Trabalho, construiu uma carreira de dedicação especial na luta pela utilização da aprendizagem como ferramenta de combate e prevenção às vulnerabilidades que atingem os jovens. Atualmente ela é coordenadora Estadual da Aprendizagem, desempenha papel articulador nas ações de prevenção e erradicação do trabalho infantil e batalha pela ampliação do programa jovem aprendiz. Também está à frente de órgãos como o Fórum Gaúcho da Aprendizagem Profissional (FOGAP/RS), Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil (FEPETI) e o Fórum de Aprendizagem Profissional da Serra Gaúcha (FAPSG).
Por isso, quando o SindiTabaco e empresas associadas começaram a projetar a criação do Instituto Crescer Legal e a planejar a ação que inclui jovens aprendizes, recorreram às orientações de Denise Brambilla. E o resultado está aí. Fundado em 23 de abril de 2015, o Instituto já certificou quase 900 adolescentes em seu Programa de Aprendizagem Profissional Rural, no qual filhos de produtores são contratados dentro da Lei da Aprendizagem para frequentarem o curso de Empreendedorismo e Gestão Rural. Até 2023, foram formados jovens de 18 municípios, sendo 17 no Rio Grande do Sul e um de Santa Catarina. E em 2024, a abrangência foi ampliada também para o Paraná, com 167 jovens aprendizes frequentando cursos em sete municípios nos três estados sul-brasileiros.
Leia abaixo a entrevista com a auditora fiscal do Ministério do Trabalho.
Em sua histórica atuação direcionada ao incentivo à aprendizagem profissional, a senhora tem percebido avanços na oferta de oportunidades aos jovens? Por quê?
Dra. Denise Brambilla: Temos tido, sim, um avanço significativo na contratação de jovens aprendizes. Ainda não é o suficiente. Precisamos percorrer uma bela jornada para atingir o mínimo de 5% de contratos de aprendizes na totalidade de empregados que demandam formação profissional nas empresas de médio e grande porte. Os empregos que demandam formação profissional abrangem todos os empregados da empresa exceto: os que exercem atividades de direção, gerência, cargos de confiança, os que necessitam de curso superior para exercer, os que necessitam de cursos técnicos para exercer, as funções preenchidas por trabalhador temporário e os próprios aprendizes. As outras funções entram na Base de Cálculo para aplicar o 5% e definir a cota.
A demanda atual no Rio Grande do Sul é de 64.820 aprendizes; estão contratados 46.791. Faltam contratar 18.029 aprendizes para atingir a cota mínima de 5%. Estamos com o percentual de 72,18%.
Como incentivadora e membro participante da criação do Instituto Crescer Legal, como a senhora percebe a iniciativa dando resultados promissores nas vidas dos jovens do campo?
Dra. Denise Brambilla: Houve momentos que o jovem do campo não percebia outro caminho a não ser estar, com a família, na produção. O Instituto Crescer Legal veio para mudar o rumo da história e desenvolver no jovem do campo técnicas e visões empreendedoras estando no ambiente que sempre viveu, valorizando o chão que lhe é familiar. Conhecendo as várias possibilidades de crescer, fazendo aquilo que sabe na convivência desde criança, trabalhando a terra para que seja uma fonte de renda saudável. Se o jovem do campo, nesse cenário, quiser mesmo assim ir para a cidade, ele sabe perfeitamente o que está deixando para trás.
O Instituto Crescer Legal oportuniza aos adolescentes que façam o curso Empreendedorismo e Gestão Rural no turno oposto ao do ensino regular, sendo, para isso, contratados como jovens aprendizes. A senhora considera essa é uma boa alternativa para evitar o trabalho infantil? Por quê?
Dra. Denise Brambilla: Não somente a aprendizagem profissional combate o trabalho infantil, como também evita a evasão escolar. A aprendizagem profissional exige que o adolescente continue estudando, num turno a formação básica e oficial para se profissionalizar no turno inverso. Ele tem um Contrato de Trabalho com a empresa que o cotiza com Direitos Trabalhistas, como: CTPS assinada, o salário regional hora, férias, 1/3 sobre férias, gratificação natalina, recolhimento de FGTS de 2%, direitos previdenciários e vale-transporte. Além dos direitos existentes, o aprendiz tem deveres a cumprir, pois tem que continuar estudando na escola regular.
Estamos enfrentando problemas com o turno inverso e carga horária ampliada com o ensino médio, que não reconhece o currículo da profissionalização como um Direito Constitucional e como um complemento curricular do quinto Itinerário da Educação. Tenho sugerido um diálogo entre o sistema de educação formal com o sistema da aprendizagem profissional, os dois voltados à educação, para que se chegue a complementação de ambos os institutos. Pensando sempre no adolescente e jovem que terá uma formação para o trabalho qualificado e digno, com escolaridade e capacitação.
O Fórum Gaúcho de Aprendizagem Profissional, o qual a senhora coordena, tem entre as ações, o lançamento de periódicos como o livro ‘Aprendizagem e Erradicação do Trabalho Infantil em prosa, verso e imagem’, com produções de textos e desenhos dos próprios aprendizes. Que benefícios isso traz para a autoestima e pensamento crítico dos jovens autores?
Dra. Denise Brambilla: Para que a aprendizagem profissional seja mais e mais conhecida por todas as camadas da sociedade, adolescentes e jovens, famílias, empresários, políticos temos a constituição de três fóruns no Estado: o FEPETI – Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil, o FOGAP – Fórum Gaúcho da Aprendizagem Profissional e o FAPSG – Fórum de Aprendizagem Profissional da Serra Gaúcha, que vêm divulgando ao longo desses anos a importância da aprendizagem profissional. Sabemos que no Brasil temos cerca de 4 milhões de adolescentes e jovens que não estudam e nem trabalham. Se as empresas cumprissem a cota máxima de 15% de contratos de aprendizes, nós chegaríamos a mais de 3 milhões. Esses aprendizes estariam estudando num turno e, no outro turno, se profissionalizando.
Diante disso, os fóruns têm realizado feiras de aprendizagem, seminários estaduais e regionais e publicado anualmente a Revista Aprendiz e o livro escrito pelos próprios aprendizes em Prosa, Verso e Imagem. Com os temas trabalho infantil e aprendizagem profissional, há concurso interno de cada entidade formadora e os melhores são editados num livro, que é lançado em evento estadual com os jovens e proporcionando ao público uma sessão de autógrafos. É lindo e emocionante, vemos nesses momentos que existem milagres.