Se a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovar resolução proibindo uso de aditivos (ingredientes) diversos misturados ao tabaco na industrialização do cigarro, mais de 99% do mercado brasileiro do produto será inviável comercialmente. Isso gerará uma crise socioeconômica desastrosa, especialmente nos estados do Sul, onde se concentra 96% da produção de tabaco nacional e reúne mais de 1,5 milhão de trabalhadores e produtores. A expectativa é que a Anvisa se pronuncie a respeito na próxima semana.
O alerta consta de manifesto divulgado hoje (8/3), em Brasília, pela cadeia produtiva do tabaco, representada por associações e sindicatos de indústrias e fumicultores, durante entrevista coletiva. Também participaram deputados federais e prefeitos da Região Sul. Os cigarros industrializados no Brasil utilizam uma mistura de tabacos, chamada American Blend, com ingredientes que estabilizam o produto, assegurando vida útil. Essa mistura obedece a legislação brasileira.
O objetivo alegado por um Diretor da área de tabagismo da Anvisa, que propôs o texto com a restrição dos aditivos ao colegiado da Agência reguladora, é que tal medida reduziria a incidência de fumantes, com a justificativa de que os aditivos tornariam os cigarros mais atrativos, em especial aos jovens. Segundo esse mesmo Diretor, a proposta estaria em consonância com o texto das diretrizes parciais sobre os Artigos 9 e 10 da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, que tratam da regulamentação da utilização de aditivos na fabricação de produtos de tabaco e foram aprovadas na Quarta Conferência das Partes ocorrida em 2010 (COP4).
Os representantes do setor contestam e dizem que a proposta não observou importante recomendação presente nas referidas diretrizes, que explicitamente sugerem que os países, ao regulamentarem o uso de aditivos, levem em consideração “evidências científicas” e “circunstâncias e prioridades nacionais”.
“A proposta desse Diretor é uma cópia de uma lei canadense, que a adotou para estabelecer naquele país uma reserva de mercado para o cigarro produzido localmente. É, portanto, uma questão de interesse do Canadá e não pode simplesmente ser adotada no Brasil”, afirmou Romeu Schneider, Presidente da Câmara setorial do Tabaco.
Setor a favor de eliminar novos sabores adocicados
A cadeia produtiva do tabaco também se posicionou a favor da eliminação de sabores característicos, como chocolate, morango, baunilha – que representam novidade no mercado -, porém, defendeu a manutenção do cigarro mentolado e com sabor de cravo. Estes dois são tradicionais no mercado nacional e internacional e não há qualquer comprovação de que induzam ao consumo do produto pelos mais jovens. “O mentolado por exemplo existe desde a década de 1920 e, assim como o cigarro de cravo, é um produto tradicional. São destinados para adultos e não para jovens. A lei é clara ao proibir venda para menores de idade”, enfatizou Carlos Galant, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Fumo (Abifumo).
O mentol é um dos aditivos que o Diretor da área de tabagismo pretende eliminar, alegando que tem efeito de atratividade para o público jovem.Diz o manifesto que “Neste sentido, ao comparar dados de diferentes países, não se nota qualquer relação entre a incidência de fumantes na população e a participação de mercado destes produtos. Também não há quaisquer evidências científicas de que esses tipos de cigarros trazem mais riscos à saúde quando comparados aos demais. Na verdade, no caso específico do mentol, existem evidências que indicam justamente o contrário. Por exemplo, um cientista do FDA (que é agência reguladora americana) publicou recentemente um estudo cuja principal conclusão é de que o risco de câncer de pulmão associado a cigarros mentolados é 41% menor do que o de cigarros não mentolados.”
O cigarro mentolado ocupa fatia de apenas 3% do mercado nacional. “Nos últimos anos, o governo conseguiu reduzir o contrabando de cigarros para o Brasil em uns 5%. Se proibir o cigarro mentolado produzido legalmente vai incentivar o aumento do contrabando desse produto para o País”, afirmou Romeu Schneider. Clayton Machado, Presidente do Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes, concordou: “o consumidor tem o hábito de comprar o mentolado nos estabelecimentos comerciais. Caso de a proibição pela Anvisa passar a valer, o consumidor tenderia a comprar produto ilegal. Uma parte dos comerciantes poderia, também, passar a comercializar produto de origem duvidosa em razão da demanda”.
Tanto Schneider quanto Iro Schunke, Presidente do Sindicato Interestadual do Tabaco (Sinditabaco), defenderam a criação de uma Câmara Multidisciplinar, reunindo a cadeia produtiva, Anvisa e outros componentes para ampliar o debate sobre a questão dos aditivos ao cigarro e promover maior conhecimento técnico sobre o tema. “É preciso prazo e democratizar o debate para se tomar a decisão mais adequada”, disse Schunke.
O banimento dos aditivos, segundo Romeu Schneider, afetaria a produção brasileira de tabaco e daria margem ao aumento da produção e exportação em outros países, ameaçando a liderança do Brasil no mercado mundial de tabaco, como maior exportador e segundo maior produtor. Em 2011, foram colhidas 832 mil toneladas de tabaco, que representam, em termos econômicos, uma receita de R$ 4,106 bilhões.
O manifesto pontua alguns dos impactos negativos da medida proposta pelo Diretor da Anvisa. Em suma, a inviabilização da produção legal dos cigarros atualmente comercializados no País constituirá:
• grande incentivo ao comércio ilegal, atualmente estimado em 30% do mercado total
• impacto direto nos cofres públicos, ao reduzir a arrecadação atual de R$ 17,4 bilhões em impostos
• diminuição dos postos de trabalho direta e indiretamente gerados na cadeia produtiva do tabaco, que atualmente chegam a 2,5 milhões
• perda de renda no campo para milhares de pequenos produtores de tabaco e suas famílias, afetando a agricultura dos três estados da Região Sul do Brasil.
Fonte: Profissionais do Texto